Heróis da pesquisa: Nelsom Marangoni

Estreamos seção nova!

É um prazer compartilhar com vocês o nascimento de uma seção em nosso blog "Heróis da pesquisa"

Heróis da pesquisa é uma seção de entrevistas com as quais pretendemos saber mais sobre o dia-a-dia dos pesquisadores sociais que mais admiramos, e que não tem suas histórias tão conhecidas. Estamos convencidos que suas experiências e ideias serão cativantes e servirão a todos como fonte de inspiração para ajudar em nossos desafios diários. Começamos!

Nosso primeiro herói convidado é Nelsom Marangoni, formado em Psicologia e atuante no setor de pesquisas de mercado desde 1974. Foi presidente da Associação Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercado (ABIPEME) durante 4 anos. Participou em 1992 da Fundação da Associação Nacional das Agências de Pesquisa (ANEP), atual ABEP, entidade que presidiu durante 10 anos. Também foi presidente do Conselho de Autorregulamentação da ABEP até dezembro de 2011 e membro das principais associações internacionais representativas do setor.

Exerceu o cargo de presidente de desenvolvimento e negócios estratégicos do Grupo IBOPE (julho de 2010 até julho de 2011), tendo ocupado anteriormente a posição de CEO do IBOPE Inteligência por aproximadamente 10 anos. Também trabalhou e em outra empresa multinacional da área de pesquisa (RI) por cerca de 15 anos. Atualmente é Diretor- Presidente da MC15.

 

Quando você era criança, o que queria ser quando adulto?

A primeira profissão que esteve presente em minhas fantasias foi a de boiadeiro. Morando numa pequena cidade do interior do estado de São Paulo (Regente Feijó), onde nem asfalto e semáforos existiam é compreensível este meu primeiro desejo. Boiadas passavam na cidade sendo guiadas pelo berrante. Parecia algo mágico os bois seguindo o boiadeiro que assoprava este instrumento. Tinha muita vontade de usá-lo e, ainda hoje tenho um berrante em minha casa.

Após este primeiro sonho fui despertado por um outro: ser motorista de caminhão. O que me encantava era a competência do motorista em guiar um veículo “daquele tamanho” (na minha percepção era enorme, muito grande) e a possibilidade de viajar, conhecer novos lugares. Isto significava para mim ampliar minhas vivências.

Respondendo agora esta pergunta, percebo que estes dois primeiros sonhos continuam elementos que contribuíram para o meu desenvolvimento profissional. Os desejos de ser eficiente, de guiar e de ampliar conhecimentos inerentes a estas duas profissões permanecem na minha atividade profissional.

 

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Quando e como você iniciou sua carreira como pesquisador?

Quando ainda estava na Universidade surgiu a possiblidade de fazer um trabalho como free lancer (1970). Eu cursava Psicologia e me chamaram para moderar e analisar “Discussões em Grupo”. Este procedimento metodológico estava em intenso e rápido desenvolvimento no Brasil. Gostei desta primeira experiência, mas não dei continuidade de forma imediata.

Algum tempo depois a agência de publicidade J.W.Thompson que tinha um departamento de pesquisa estava querendo contratar um profissional do sexo masculino, pois acreditava que a discussão de alguns temas não poderia ser feita por moderadoras do sexo feminino. Estávamos em 1972.

O fato de ser do sexo masculino e, não por outros critérios técnicos, é que me conduziram ao primeiro emprego na atividade. Trabalhei nesta agência durante aproximadamente quatro anos e, realizando apenas projetos qualitativos. Achava que esta metodologia seria adequada para a maioria dos problemas de Marketing sem deixar de ter interesse pela área quantitativa. Depois de algum tempo, percebi que para ser um profissional completo eu deveria ter o domínio das técnicas e conhecimento teórico das áreas qualitativa e quantitativa.

Mudei de emprego também por outras razões e, busquei uma outra empresa onde pudesse ser treinado na área quantitativa. Assim, pude me transformar num “pesquisador de mercado”, eliminando-se a idealização que eu fazia da Psicologia e das “técnicas qualitativas”.

 

Quem é seu herói e/ou heroína no mundo da pesquisa?

Eu comecei em pesquisa quando a atividade estava em intenso desenvolvimento. Inúmeros profissionais advindos de outras áreas se destacavam na atividade. Tive vários “modelos” para seguir e, que representavam características relevantes e diferentes como os relacionados ao aspecto técnico (Alfredo Carmo e Álvaro Marchi) e o lado empresarial (Arthur Cesar).

Nesta época predominavam os profissionais voltados para os processos, ou seja, para a parte técnica da atividade. Neste sentido tive a contribuição de profissionais advindos da Psicologia e Sociologia que deram um impulso significativo para o desenvolvimento da pesquisa qualitativa no Brasil.

Hoje no nosso país, têm inúmeros profissionais competentes e, que através de cursos e palestras continuam oferecendo conhecimento e experiência aos demais.

 

Se você tivesse que destacar uma, qual a qualidade que todo pesquisador social deveria ter?

Acho difícil, senão impossível, destacar uma única característica ao pesquisador social e, mesmo a qualquer pesquisador. Se ele tivesse apenas esta única qualidade ele seria incompleto, especialmente em função da complexidade e rápidas mudanças que ocorrem no mundo.

No mínimo ele precisaria ter:

  • espírito científico para explicar de forma precisa a relação entre os fenômenos
  • pensamento estratégico para ser significativo na tomada de decisões
  • capacidade e flexibilidade para integrar informações de diversas fontes de dados

 

Como você se inspira para criar? Que mundos fora do mundo da pesquisa te inspiram mais?

O próprio mundo da pesquisa é inspirador, pois acredito que a criatividade é decorrente primariamente da associação de ideias. Todavia, para o próprio mundo da pesquisa ser inspirador é fundamental que você não fique restrito, ou seja, busque informações de diversas metodologias, técnicas e aprimore o conhecimento de Ciências e, especialmente as Ciências Humanas e, também de áreas relacionadas à Pesquisa (Marketing, Comunicação, etc).

Fora do mundo da pesquisa a leitura e o cinema ocupam lugar de destaque. Eles ampliam o conhecimento, contribuem para o exercício da reflexão e para uma melhor compreensão sobre você mesmo e, suas experiências. Também me ajuda a ter novas ideias, caminhar livremente (não com o intuito de exercitar) principalmente em contato com a natureza.

 

Qual a pesquisa mais interessante que você fez?

A pesquisa mais interessante foi sobre Mulheres. Num período de 6 anos realizamos três projetos sobre as atitudes, valores, papéis sociais e profissionais das mulheres. Foi possível caracterizar diferentes grupos de mulheres (segmentação) e acompanhar a evolução das mesmas numa época em que este segmento da população estava envolvido com novas aspirações e conquistas sociais.

Foi bastante estimulante estar envolvido:

  • no uso de diferentes metodologias
  • na integração de informações avindas das mulheres, informações dos especialistas que tinham relação profissional com elas e “dados secundários”
  • em inúmeras apresentações para Anunciantes, Veículos, Entidades de classe e Governo

Além de nos fornecer uma melhor compreensão com quem nos relacionamos diariamente, os estudos contribuíram para o Marketing e Comunicação de marcas e empresas e, também para  políticas públicas. Todos repensaram este segmento que estava em rápida transformação.

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Como você define o momento em qual se encontra nosso setor? O que deveria ser mudado para agregar valor às outras peças de marketing e, em última instancia, do cidadão? 

Em função da rápida transformação da tecnologia, da globalização, do volume enorme de informações e das novas demandas dos clientes (mercados cada vez mais competitivos) a pesquisa está passando por um momento de transição.

A atividade de “Pesquisa de Mercado”, a exemplo de áreas afins como Comunicação e Marketing, está em acelerado processo de mudança. A evolução da sociedade e, consequentemente, de seus cidadãos e consumidores, e a onipresença dos meios digitais gerando um volume enorme de informações e meios de coleta têm impactado diretamente nossa atividade. As empresas clientes, em função destas mudanças e com um mundo de negócios mais competitivo e dinâmico, têm apresentado uma nova demanda em relação ao trabalho das empresas de pesquisa e seus profissionais. Há uma busca crescente de “insights”, inovação, de conhecimento, de tendências e maior contribuição estratégica para que possam elaborar planos de Comunicação e de Negócios mais adequados à complexidade da situação atual, à “mudança permanente” e à maior competitividade dos mercados.

Estamos em transição e os investimentos das empresas nesta atividade continuam crescendo, o que nos possibilita o ajustamento a esta nova realidade e inúmeras possiblidades de inovação. Falta ainda no Brasil um uso mais amplo e adequado da pesquisa para a orientação de políticas públicas nas diferentes áreas o que contribuiria diretamente para a melhoria da vida dos cidadãos.

 

Como você imagina que será a pesquisa dentro de 10 anos? Quais os desafios que enfrentaremos, especialmente no Brasil?

É difícil imaginar de forma precisa como será a atividade daqui a 10 anos. Todavia, posso dizer que ela será bem diferente.

Numa pesquisa que apresentei num congresso brasileiro em 2010, mostrava que a maioria dos clientes achava que a pesquisa tal como estava tendia a desaparecer. A expectativa de um papel de consultoria estava presente, se intensificou nos últimos anos e, marcará as próximas décadas. Além disto também mudanças nas técnicas de coleta, no instrumental de análise, no aproveitamento de diversas informações e na atitude do pesquisador deverão estar concretizadas. Empresas de pesquisa e profissionais estarão envolvidos com novos desafios e terão que mudar.

Vale refletir sobre alguns aspectos que já estão ocorrendo e/ou farão parte do futuro:

  • necessidade de um profissional mais estratégico, flexível, criativo e mais focado nos negócios do cliente e, não nos processos de pesquisa;
  • ter um profissional com mais habilidades para usar e integrar informações de diferentes fontes;
  • melhorar a compreensão e utilização dos meios online e off-line; o antagonismo e o desejo de substituição entre eles será abandonado ou pelo menos atenuado e, cada um será usado para objetivos pertinentes e específicos;
  • buscar a ampliação dos usos da Internet, especialmente para a área qualitativa e análise de conteúdo das redes sociais;
  • adequar o instrumental de coleta e análise sobre a Comunicação de marcas e Audiência dos diferentes meios;
  • melhor configuração dos bancos de dados e análises mais relevantes para ações estratégicas dos clientes.

Em resumo, podemos afirmar que já estamos “experimentando o futuro” através de uma adequada transição com inúmeras possibilidades de inovação técnica e de negócios.

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Qual filme ou livro você acha que todo pesquisador deveria ler?

Literatura e cinema são fundamentais para que todos tenham uma melhor compreensão de si mesmo e do mundo e, para a expressão dos sentimentos e opiniões. Portanto, todo pesquisador deve ler além dos livros técnicos, dos manuais, das revistas e dos jornais específicos, deve ler sobre Marketing, Comunicação e Negócios e, ler e frequentar cinema sempre. Deve estar em contato com romances, dramas, ficção ou não ficção, biografias, enfim ler e assistir filmes sobre tudo. Deve refletir sobre eles, buscar significados para a sua vida pessoal e profissional.

Se pudesse dar um conselho eu diria para lerem os assuntos diretamente ligados à atividade (técnicos ou não) apenas no ambiente de trabalho e, os outros assuntos fora do ambiente de trabalho. Claro que estes últimos contribuirão para o desempenho profissional, mas isto tem que ocorrer de uma forma natural e mais prazerosa.

Livros técnicos sobre a atividade são facilmente encontrados através das Associações, como por exemplo, a Esomar. Fora da atividade gostaria de mencionar quatro livros que trouxeram algum impacto sobre mim em diferentes momentos da minha vida:

  • “Viver para contar” e “Crônica de uma morte anunciada”, ambos de Gabriel García Márquez
  • “No coração do mar” de Charlotte Kogan
  • “A menina que roubava livros” de Marcus Zusak

Embora indicações possam ser valiosas quero repetir que o importante é ler e ler sobre tudo, sempre.

 

E por último, seu lema vital em 1 tuit.

Ser transparente, buscar a excelência e respeitar a opinião e o desempenho dos outros.

 

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